A História do progresso das grandes
nações é feita pelo trabalho e a pertinácia de seus filhos. E esta é uma
história de trabalho assim. Começa em 1915, quando um jovem, Fernando Gomes
Pedroza, é encontrado em Baixa Verde, no Rio Grande do Norte, dirigindo um
campo experimental de algodão, situado no Riacho Seco.
Uma experiência em todos os sentidos: muito de ideal e absoluta pobreza
de recursos, já que o Ministério da Agricultura a que estava afeta, pouca
assistência lhe dava, além dos seiscentos mil réis do ordenado mensal de seu
chefe, recebido de raro em raro, naquelas lonjuras do tempo.
Pedroza fora para ali viver como autêntico pioneiro. Casara em São Paulo
e para ali trouxera, a conviver com seus sonhos e dificuldades, uma Toledo
Piza. Dona Branca. Do estabelecimento do casal na região, naquele remoto lugar
do interior, formar-se-ia uma tradição.
O antes e o depois.
Antes, a confusa tradição, o tumulto do plantio e a incógnita da
colheita: o quase inexistente beneficiamento. Ninguém pensava em tipos ou em
qualquer espécie de seleção, vigorando os mesmos processos de compra de
outrora, do tempo do lombo de burro.
A presença de Fernando Pedroza iria mudar tudo e marcar a nova história
econômica do Estado.
Num exemplo pessoal de empenho e dedicação, de saber fazer, ele começou
a ser visto por toda a parte, no campo, junto com os homens que despertou para
o trabalho, com eles calejando as mãos e manejando arados, plantando,
discutindo, morando em barracas; como um deles, seguindo a tradição familiar
onde avultavam homens vitoriosos. Seu avô, Fabrício Gomes Pedroza, paraibano,
foi um deles, vindo em 1847 para o Jundiaí, em Coité, que iria transformar em
Macaíba, espalhando determinação à sua volta.
Ali, Fabrício realizaria três casamentos, erguendo na curva do rio
Potengi, no alto de um morro, a Casa Grande dos Guarapes, sede do seu trabalho,
fornecendo para 50 léguas ao redor, centralizando quase toda a produção
açucareira da província, alicerçada em vinte navios com linha direta para a
Inglaterra. O filho, o segundo Fabrício, ali nasceu e tomou o seu lugar.
Fernando também nasceu em Guarapes, em 30 de março de 1886, filho de Fabrício
Gomes Pedroza II e de Isabel Cândida de Albuquerque Maranhão, educando-se na
mesma Inglaterra para onde ia o açúcar de suas terras. E foi lá, mais
propriamente em Liverpool, que lhe foi dado estudar o mercado do algodão,
ouvindo as reclamações e as críticas dos importadores e vendo a massa confusa e
suja que era mandada daqui para lá.
Ao voltar ao Brasil não quis ser negociante no Rio, como era o desejo
paterno. Antes preferiu o interior e a dedicação ao algodão, cujo futuro
entreviu na sua estada européia.
A recusa do filho a seus desejos, abalou seu pai, que, tentando
curvá-lo, retirou-lhe todo e qualquer auxílio. Fernando foi ao Ministro da
Agricultura. Convenceu quem tinha a convencer e com os 600$000 do ordenado
lançou-se à conquista de Baixa Verde. E ali ficou até à morte, fiel a dois
amores: Dona Branca e à terra em que acreditava.
Em Baixa Verde conheceu João Câmara e nele reconheceu o companheiro
ideal para as duras batalhas que enfrentariam, possuindo de si apenas o capital
de duas férreas forças de vontade. O entendimento e a união dessas duas forças
foi fácil, rápido e óbvio.
Fernando Gomes Pedroza envolveu-se numa guerra: a aclimatação do Sea
Island do Mocó e Herbaceum, contra a estiagem, a distância
de elementos de trabalho, a lentidão da eterna burocracia ministerial. A
primeira safra foi devastada pela seca. A segunda não ultrapassou 300 quilos
por hectare. Nada, porém, o faria desistir, nem as dificuldades com os homens,
nem as asperezas da terra e do clima.
Esperava talvez milagres e o trabalho os fez. Milagre foi plantar e
colher algodão com uma queda pluviométrica inferior a 80 milímetros o que
motivou uma utilização diária e constante de cultivadores, com a qual se
realizou o primeiro ensaio de cultura seca no Brasil.
Gente entusiasmada acorreu a cooperar, como o técnico norte-americano
Edward Charles Green - o doutor Green - como o povo o chamava, de grande valia
na seleção e de enorme estímulo em tomo de uma esperança teimosa que a miopia
funcional não enxergava.
Deixando de ser funcionário público, Fernando passou a trabalhar
sozinho, sem abandonar o seu algodão que tanto o apaixonara. E fixou-se na
Barriguda, na Serra Verde, plantado centenas de hectares de um novo tipo,
o Upland, batizado em português como Verdão.
O ano de 1917 marca uma ascensão decisiva na vida de Fernando. Por
intermédio do doutor Green, conhece outro norte-americano. Clarence Wharton, um
jovem de sua idade, que faleceria em Southampton, em 1922, com apenas 36 anos
de vida.
Os dois tomaram-se íntimos e sócios. Um escritório comercial apareceu,
tendo Green na parte técnica e instalado num quartinho asfixiante do Hotel
Internacional, na rua do Comércio, hoje Chile, na capital potiguar. Em 1918, a
firma Wharton, Pedroza Cia. é uma realidade e breve simbolizaria o próprio
vigor do mercado da região, embora o capital continuasse a ser medido mais pela
vontade, o conhecimento, a energia e a coragem, do que pelo dinheiro. Aí foi
posto em prática o velho sonho que era um programa: o algodão fará o mercado,
afirmava diariamente Pedroza. O problema estará na seleção das sementes e na
melhoria do maquinário que, naquela ocasião, não dispunha nem de cevadores
mecânicos, nem de limpadeiras.
E a firma partiu para a audácia: importação foram feitas. Aperfeiçoou o
trabalho. Inovou na maneira de colher o algodão: em dois sacos, um para cada
lado, de tipos diversos. Que se evitasse a folha seca, o sujo de areia, o
garrancho.
Era preciso padronizar os tipos para a compra, o que significava exportações
maiores para a Inglaterra, para os seus insaciáveis teares. E a Wharton,
Pedroza criou os tipos: alfa, beta, gama, correspondendo ao algodão de
primeira, de segunda, de terceira, segundo a fibra e a homogeneidade, tipos que
pouco a pouco se firmaram no mercado: o Seridó, de fibra longa; o Sertão, de
fibra média e o Herbáceo, de fibra curta. Em 1933 o Governo Federal - quatorze
anos depois da inovação dos arrojados pioneiros - tornava enfim obrigatória
essa padronização nos tipos de exportação.
Da boa semente, o bom fruto. Do modesto escritório, cresceu a mais
perfeita rede comercial então conhecida, com as pessoas certas nos lugares
corretos, agentes nos municípios de produção conhecida ou iniciada. Gente que
registrou nome no reconhecimento à sua obra, multiplicadora de áreas de
plantio, estimuladora de um trabalho constante, produtivo, e útil, estimuladora
do interesse pela certeza e limpidez das transações financeiras, oriundas do
trabalho correto e da rentabilidade desses esforços: Ezequiel Mergelino de
Souza, em Santa Cruz: Florêncio Luciano, em Parelhas e Jardim do Seridó: Celso
Dantas, no Caicó: Antônio Bezerra e Vivaldo Pereira, em Currais Novos; Adonias
Galvão, em Flores (Florânia); João Pinheiro de Meio, em Santana do Matos;
Francisco Fernandes, no Assú; Antônio Telmo e José Inácio Pereira do Lago, em
Lages; Francisco Gonzaga Galvão, em Angicos; Tomás Resende, no Acari e João
Severino da Câmara, em Baixa Verde.
Novas práticas comerciais agilizavam o aumento da produção, enquanto
Fernando expandia as atividades tanto agrícolas como pastoris, transformando a
Fazenda São Joaquim em verdadeira estação experimental entregue à competência
de técnicos, em busca de novos métodos e aperfeiçoamentos científicos,
instalando igualmente uma fábrica de óleo de caroço de algodão na pequena vila
de São Romão, que hoje, orgulhosamente, se chama Fernando Pedroza.
Em fins de 1925, a Cia. Brasileira de Linhas para Cozer (hoje a
Algodoeira São Miguel) adquire, por influência de Fernando, a Fazenda São
Miguel, anexa à São Joaquim, com Edward Roque à frente e também organiza
estações experimentais na região, visando a melhoria da fibra de algodão a
utilizar em suas máquinas. E o resultado de todo esse esforço não se faz
esperar: a 6 de novembro de 1925, a São Miguel adquire, de Wharton &
Pedroza, o primeiro lote de fardos de algodão para exportação.
A morte de Wharton transforma a firma em S.A.. Anos mais tarde Pedroza
se retira. Os nomes dos dois, porém, assegura probidade e confiança, e Wharton,
Pedroza continua a firma, mesmo sem eles. Pedroza voltaria mais tarde, antes
porém, queria consagrar-se à sua velha fazenda ao seu paraíso.
A Usina São Joaquim espelha o seu vigor de sempre. Construída em 1929,
no povoado de São Romão, até aí um conglomerado de pequenas casas de taipa com
capela e feira, acabou por influir decisivamente em seu destino, como núcleo e
fator de seu desenvolvimento. Comprando e beneficiando algodão, fabricando
óleo, torta, pasta e outros produtos derivados, atraiu a riqueza para a região,
civilizando e semeando progresso.
Ali, na praça principal, no ex-povoado que Fernando fez cidade, a 11 de
setembro de 1938, inaugurava-se o seu busto, homenagem ao patrono falecido dois
anos antes, em março de 1936. Homenagem ao homem sólido, de
fisionomia enérgica, cuja palavra valia por um contrato, sempre ao lado dos
desbravadores, daqueles que, como ele, sempre acreditavam no futuro. Homenagem
ao homem cuja vida foi uma sementeira de realizações e de ideias, um idealista
e homem de sociedade, um progressista na mais ampla acepção do termo, fundador
- com Juvenal Lamartine e outros amigos - do Aeroclube de Natal, corolário
daquela aventura de dois anos antes, quando adquiriu um Curtiss
Air-Boat para suas viagens ao Recife e ao Rio de Janeiro.
O escritor João Amorim Guimarães - em “Natal do meu tempo” lembra-lhe a
vida como um atestado de trabalho, energia e patriotismo. Um fidalgo, a merecer
uma estátua em bronze puro, desta vez na maior praça de Natal ou o nome a
distinguir a grande estrada de automóveis de Natal ao Seridó, sertão a dentro,
o seu sertão que ajudou a erguer-se.
Seus descendentes honram o seu nome. De seu casamento com Branca Piza
Pedroza, nasceu Fabrício que também foi industrial e morreu num desastre de
aviação; nasceu Sílvio, que foi prefeito de Natal, deputado e governador do
Estado; Fernando, empresário e ex-prefeito de Angicos, que doou áreas de suas
terras para a instalação de Barreira do Inferno, e Elza, esposa do aviador
Graco Magalhães Alves.
Pelo trabalho desenvolvido na antiga comunidade de São Romão, Fabrício
Pedroza teve inaugurado seu busto em bronze em 1938, assim como foi
denominado patrono da cidade criada pela Lei nº 6.301, de 26 de junho de 1996,
cujo gentílico é fernandopedrozense. Fernando Gomes Pedroza é mais que um
grande nome: representa a semente maravilhosa, vencedora do chão difícil que só
a audácia, a insistência e o trabalho correto, persistente e organizado.
Conseguem fazer germinar.
FONTE – BLOG HISTÓRIA E GENEALOGIA